“HOJE EM DIA EU MAL ASSISTO TV.”
- viniciusvba
- há 6 dias
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Atualizado: há 4 dias

Escuto desde a minha formação em RTVI um comentário que virou quase um mantra: “Hoje em dia eu mal assisto TV.” Sempre que ouço isso, sinto um certo elitismo escondido na frase, como se a televisão fosse um meio ultrapassado, um hábito menor diante das novidades digitais. Mas basta devolver a pergunta: “E o que você assiste, então?” A resposta vem sem demora: futebol, Netflix, YouTube, Cazé TV, Blogueirinha… e por aí vai.
O curioso é que muita gente não percebe que tudo isso continua sendo televisão, só mudou de plataforma. Negar a TV, no fundo, parece mais uma performance de distinção cultural do que uma constatação real.
Vale lembrar que a ciência da comunicação brasileira nunca foi atrasada.
Pelo contrário, sempre esteve na dianteira. O rádio levou informação de qualidade a milhões de pessoas quando parecia impensável. A televisão brasileira se tornou referência mundial em teledramaturgia e jornalismo. Não é exagero dizer que o Brasil mostrou e continua mostrando caminhos criativos e ousados de pensar comunicação de massa.
Na faculdade, confesso que torcia o nariz para Marshall McLuhan e sua famosa ideia de que os meios são extensões do homem. Mas hoje, olhando para o que a TV virou, fica difícil discordar. A televisão deixou de ser apenas uma caixa que mostra imagens; virou extensão do nosso olhar e do nosso tempo social. A metáfora mais verossímil dessa tese é aquela de estender a mão e apanhar um produto da tela como se fosse uma prateleira de supermercado.
Parece viagem, mas não é. Está acontecendo: QR codes, compras em dois cliques e vitrines dentro das plataformas transformam desejo em ação sem atrapalhar a experiência narrativa. A roupa de um personagem, a decoração de um cenário ou até um prato de comida podem se tornar objeto de consumo instantâneo. Conteúdo e comércio juntos no mesmo fluxo.

Eventos esportivos continuam sendo um exemplo notável dessa força. A Copa do Mundo transmitida pela Cazé TV e os Jogos Olímpicos acompanhados por milhões de brasileiros provam que a linguagem televisiva resiste. O que muda é só a origem do sinal. A experiência coletiva, o ritual de acompanhar e a conversa em torno do que acontece na tela seguem firmes, seja num canal aberto, numa FAST TV ou num streaming.

E não é só no esporte que esse peso aparece. Plataformas como Netflix, Disney Plus, Max e Amazon Prime Video estão apostando pesado em transmissões de grande impacto justamente para capturar esse mesmo senso de coletividade. Foi assim com o especial natalino da NFL, que ganhou ainda mais atenção por ter um show de intervalo da Beyoncé.
Também vimos isso quando a Max transmitiu o Oscar deste ano, acompanhado por todo o Brasil na torcida pela Fernanda Torres. E mais: a Amazon levou Ed Sheeran direto para a tela em um show global que reforçou como o streaming está cada vez mais interessado em ocupar esse território da televisão em tempo real.

Esses casos não são exceções isoladas, mas parte de uma estratégia clara e cara de manter viva a dimensão coletiva do audiovisual.
Nesse contexto, a TV 3.0 surge como uma promessa ainda mais ousada: transmissão híbrida com internet de altíssima velocidade, interatividade total e novas formas de publicidade. É como se a televisão se preparasse para fundir definitivamente entretenimento, comércio e comunidade num mesmo espaço.
No fim das contas, a pergunta nunca foi “a TV vai morrer?”, mas sim “como ela vai continuar se transformando?”. A resposta está diante dos nossos olhos: ela já mudou, continua mudando e, se depender do Brasil, vai seguir surpreendendo o mundo. Mas há um ponto essencial nesse caminho: é urgente que os profissionais de comunicação compreendam e dominem os formatos clássicos da televisão, que funcionam com maestria há décadas no país. O que veio antes não é peça de museu nem peso morto, e sim a base mais revolucionária que temos.
Muitas vezes, o que hoje é vendido como ousadia de uma geração já foi feito, de forma até mais inventiva, por quem construiu a TV brasileira. Entender esse legado é condição para reinventar o futuro sem cair em repetições disfarçadas de novidade.
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